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Millennials e Pós-millennials poderão anunciar libertação


As mídias contemporâneas ainda estão cheias de opiniões sobre os Millennials, o bolsão geracional formado essencialmente por jovens nascidos nos anos 80, e analistas de cultura já anunciam os Pós-millennials, gente ainda mais nova e entrando agora no mercado de trabalho. Em ambos os casos, a voz do senso comum soa pessimista. Mesmo com suas diferenças, as duas são descritas como gerações que acreditam serem herdeiras naturais de privilégios e direitos, distraem-se com facilidade, são impacientes, egocêntricas, preguiçosas e geralmente não duram muito em nenhum emprego. O sonho da longa e estável carreira, comum aos Baby boomers, parece não existir mais. Ao mesmo tempo, esses jovens procuram propósito, querem saber a todo instante se estão acertando e valorizam o mítico equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Enquanto discutem-se diferenças entre as gerações, temas centrais como materialismo, cultura organizacional e ética profissional permanecem negligenciados. Talvez os Millennials e Pós-millennials já vislumbrem o mundo com o qual sonhamos. O argumento é simples: Talvez, eles possuam o potencial para resgatar a imaginação profética de nosso tempo.

Antes de seguir adiante, no entanto, é preciso livrar-se da imagem de que profetas são somente aqueles que vivem reclusos, têm hábitos alimentares excêntricos, vaticinam em público e que, por tudo isso, são geralmente ignorados. Embora esses elementos sejam, de fato, parte da tradição profética no contexto judaico-cristão, o papel do profeta vai além dos estereótipos. O estudioso de Antigo Testamento, Walter Brueggemann, define a tarefa do profeta como a de nutrir e suscitar uma consciência e percepção alternativas à consciência e percepção da cultura dominante ao nosso redor. Note-se que embora a luta social seja frequentemente associada à ação profética, na narrativa bíblica eles estão preocupados com algo mais profundo: o entendimento de Deus e do mundo. A consciência alternativa serve ao propósito de criticar e, consequentemente, desmantelar a consciência dominante. Também energiza pessoas e comunidades com suas promessas de um novo tempo. Mas o que caracteriza a cultura dominante? Para Brueggemann, três fatores formam a base do que ele chama de “consciência real”, ou seja, a cosmovisão de quem está no poder: uma economia de afluência e acúmulo material; uma política de opressão, para que alguns desfrutem do conforto enquanto outros são subjugados; e uma religião de acesso, na qual Deus “funciona” de acordo com regras estabelecidas pelos homens. Esses três fatores certamente resistiram ao tempo e não só estavam presentes no Antigo Oriente Próximo como estão por aí até hoje. No passado, Moisés, Jeremias, Isaías e Jesus cumpriram as dimensões de crítica aos sistemas dominantes e inspiração para uma vida diferente. Resta saber como tal tarefa seria exercida no mundo dos Millennials.

Como os profetas de Israel, muitos jovens encarnam a dor que todos sentimos. Com criatividade, quem tem vinte ou trinta e poucos anos oferece símbolos que trazem a público os medos que a consciência dominante faz questão de perpetuar e silenciar. Projetos e protestos, físicos e virtuais, comunicam metaforicamente a dor concreta de viver imerso num sistema de ideias que não satisfaz. É papel da imaginação profética levar ao engajamento com o sofrimento, em oposição à aparente tranquilidade oferecida pela consciência dominante. O conforto e o controle trazidos pelo dinheiro e pela estrutura meritocrática entorpecem os sentidos ao ponto de fazer-nos acreditar que “é assim que o mundo funciona”. Não existiria mudança possível. Mas um mundo que só é bom para alguns poucos, não é bom para ninguém. E na cultura dominante, não há muita esperança para aqueles que estão fora do sistema. Enquanto nossas estruturas corporativas também perpetuarem o modelo baseado no acúmulo, na opressão de alguns e na manipulação do que é transcendente, nossas reclamações serão sempre as mesmas.

Também é tarefa do profeta estimular o engajamento com o novo, trazido pelos processos redentores na nossa história com Deus. Jesus de Nazaré representa a quintessência da tradição profética e, como ninguém, apresentou a expressão pública de um reino totalmente novo, não derivado de nenhum dos sistemas conhecidos. Nesse reino, o conceito de liberdade não é baseado no poder econômico, mas no relacionamento com um Deus que é livre e não respeita nossas regras. Poder é expresso por uma responsabilidade de trazer justiça a todos. E a própria justiça é construída sobre a base de uma economia na qual compartilhar e não oprimir são imperativos. Muitos dessas gerações têm apresentado suas ideias nesses mesmos termos, mas nem sempre estamos prontos para aceitá-las. Achamos um “porém”, um “senão”, ou uma “agenda oculta” que descredencia esses jovens pelo simples fato de que suas ideias podem apontar para o fim do mundo como conhecemos. Temos medo.

Obviamente, nem todo nascido nos anos 80 ou 90 é um profeta. Para assumirem a posição de profetas modernos, essa turma precisa cumprir ao menos três condições essenciais: recuperar a tradição de seus pais, a fim de conhecer a fonte de toda sabedoria e inovação que a humanidade precisa – o Eterno; fugir à tentação de ceder quando economicamente pressionados ou valorizados; e evitar a todo custo o cinismo que a tudo critica e classifica como inadequado ou retrógrado. Só então, partindo do relacionamento com o Deus criador, jovens terão condições de alinhar suas bússolas morais e entender que suas justas demandas não são um mero maneirismo cultural, mas são as dores que muito mais gente sente e que eles poderão ser os profetas a proclamá-las.


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